Da Redação
Com o avanço da idade, o corpo humano passa por
transformações profundas. Entre elas, destacam-se a perda de massa e força
muscular, conhecida como sarcopenia, e o acúmulo de gordura corporal, levando à
obesidade. Quando essas duas condições ocorrem simultaneamente, surge uma
condição clínica cada vez mais comum e preocupante: a sarcobesidade, também
chamada de obesidade sarcopênica.
Essa condição, que une os riscos da obesidade
aos da perda muscular, tem ganhado atenção da comunidade científica por
representar uma ameaça crescente à saúde dos idosos. O quadro é complexo e
multifacetado, exigindo abordagens integradas para prevenção e tratamento.
Uma ameaça dupla à saúde
A sarcobesidade soma os riscos metabólicos da
obesidade — como diabetes tipo 2, hipertensão e doenças cardiovasculares — aos
perigos físicos da sarcopenia, como maior risco de quedas, fraturas e perda da
independência funcional. O tecido muscular não é importante apenas para
garantir mobilidade e equilíbrio. Ele também é fundamental para manter o
metabolismo ativo, promover o gasto eficiente de energia e auxiliar na produção
de hormônios e na defesa imunológica.
Segundo o nutrólogo Diogo Toledo, do Hospital
Israelita Albert Einstein, a sarcobesidade é especialmente preocupante porque
surge em um contexto de envelhecimento populacional acelerado e hábitos de vida
cada vez mais sedentários.
Diagnóstico ainda desafiador
Uma revisão científica conduzida pela
pesquisadora Gabriela Ortiz, do Laboratório de Fisiologia do Exercício e
Metabolismo da USP de Ribeirão Preto, destacou a ausência de critérios
padronizados para diagnosticar a sarcobesidade. Publicada na revista Ageing
Research Reviews, a revisão reforça que o tratamento deve ser personalizado e
multifatorial, considerando a complexidade da condição.
“É fundamental entender que envelhecer com
qualidade depende de uma abordagem sistêmica”, afirma Ortiz. “A sarcobesidade
precisa ser enfrentada de forma integrada, desde a prevenção até o tratamento.”
Três frentes promissoras contra a
sarcobesidade
O estudo da USP identificou três estratégias
com potencial terapêutico contra a sarcobesidade: suplementação com taurina,
modulação da microbiota intestinal e prática regular de exercícios físicos.
1. Taurina: aminoácido promissor
A taurina é um aminoácido encontrado
naturalmente em tecidos como cérebro, coração, músculos e retina. Apesar de o
organismo produzi-la em pequenas quantidades, sua principal fonte é a
alimentação — especialmente carnes, peixes, frutos-do-mar e laticínios.
Com o envelhecimento, os níveis de taurina
caem, e esse declínio está associado ao agravamento de doenças como diabetes,
hipertensão e problemas cardiovasculares. A suplementação com doses de 1,5 g a
3 g por dia tem sido estudada por seus efeitos antioxidantes e
anti-inflamatórios, que podem proteger os músculos contra a degeneração.
Contudo, tanto Ortiz quanto Toledo reforçam que
ainda são necessários ensaios clínicos mais robustos em humanos para determinar
a eficácia, a segurança e as doses ideais da suplementação.
2. Microbiota intestinal: o elo entre
intestino e músculos
Com o passar dos anos, o equilíbrio da
microbiota intestinal tende a se alterar, favorecendo um estado inflamatório
crônico que prejudica a absorção de nutrientes e a síntese de proteínas
musculares. Esse desequilíbrio, chamado de disbiose, é frequente em pessoas
obesas e pode dificultar a preservação da massa muscular.
A solução está na modulação da microbiota com
uma alimentação rica em fibras, prebíoticos e probióticos, que ajudam a
restaurar a diversidade do microbioma e estimular a síntese proteica. Ortiz
lembra que compostos produzidos por bactérias benéficas no intestino têm ação
direta na saúde muscular e metabólica.
3. Exercício físico: essencial e
adaptável
Apesar das dificuldades comuns entre os idosos
— como dores, limitações motoras e medo de se machucar — o exercício físico,
principalmente o treinamento de força, mostrou-se eficaz na prevenção e no
combate à sarcobesidade.
A prática de musculação estimula a síntese de
proteínas musculares, melhora a sensibilidade à insulina, combate a inflamação
e ajuda a manter a autonomia funcional. A recomendação é treinar de duas a três
vezes por semana, com intensidade moderada a alta, sempre sob supervisão
profissional.
“Além de fortalecer o corpo, a atividade física
também melhora o estado emocional e a autoestima dos idosos, criando um ciclo
virtuoso de saúde”, destaca Toledo.
Uma abordagem integrada e urgente
A sarcobesidade é um desafio real, mas
superável com intervenções integradas. A combinação de alimentação balanceada,
atividade física regular, suplementação adequada e cuidado com o intestino
forma uma estratégia poderosa para garantir um envelhecimento mais saudável e
funcional.
“A sarcobesidade não é apenas um problema
clínico. É uma questão de saúde pública”, reforça Gabriela Ortiz. “Precisamos
agir preventivamente, disseminando conhecimento e promovendo hábitos saudáveis
desde a meia-idade.”
Diante do aumento da expectativa de vida e das transformações corporais associadas ao envelhecimento, investir na saúde muscular e metabólica é investir na qualidade de vida dos anos futuros. E isso começa com consciência, prevenção e ação integrada.
Fonte original: Reportagem de Fernanda Bassette
para a Agência Einstein, publicada no portal VivaBem (UOL).
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