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Por Dr Dráuzio Varella

Nos últimos 20 anos, o número de faculdades de medicina no Brasil triplicou; eram 143, agora são 448. Estamos atrás apenas da Índia, que tem 605 faculdades para 1,4 bilhão de habitantes. Ganhamos dos Estados Unidos, com 195, e da China, com 129 -países muito mais populosos.

Temos cerca de 600 mil médicos em atividade, número que deverá ultrapassar 1 milhão nos próximos dez anos. Imaginar que serão distribuídos pelo território nacional para suprir as deficiências do SUS nas áreas mais remotas é acreditar em milagre.

Senão, vejamos: nossos cursos de medicina abrem 48 mil vagas por ano, 90% das quais em faculdades particulares. Não há professores com formação universitária para dar conta de tamanha demanda. Mais grave: temos vagas suficientes nos hospitais-escola para oferecer internato e residência de qualidade, estágios fundamentais para a formação de bons profissionais? Claro que não. Se hoje mais de 50% dos recém-formados ficam sem esse acesso, nos próximos anos será ainda pior.

Somente agora, nossos conselhos começam a pressionar para a criação de exames de suficiência durante o curso, com a finalidade de impedir que médicos mal formados cheguem ao mercado de trabalho. Até aqui, vivemos a situação esdrúxula de selecionar os mais preparados para as vagas de residência existentes, enquanto os reprovados vão atender doentes.


Por que o interesse em abrir tantas faculdades? Primeiro, porque em caso de venda de uma universidade para outra instituição de ensino, o valor aumenta muito - ao redor de R$ 200 milhões, segundo informações extraoficiais. Depois, porque cada aluno paga em média cerca de R$ 10 mil por mês, ou seja, cada turma de cem alunos rende R$ 1 milhão por mês.

Famílias em condições de investir tanto na formação de um filho pertencem à classe média alta. Estudantes formados sem fazer residência irão exercer a profissão nos grotões do país, lugares pobres, sem médico, em que poderiam ser úteis? Dificilmente, são meninas e meninos criados em cidades com shopping centers, áreas de lazer, academias e baladas noturnas.

A maioria dos recém-formados deseja permanecer nos grandes centros. Enquanto no interior do estado do Amazonas temos 0,2 médico para cada 1.000 habitantes; em Vitória, são 18,5; em Brasília, 6,2 e em São Paulo, 6,8.

Mas como encontrar um nicho para exercer a profissão nas cidades grandes em que a competição é acirrada? É possível que a maioria continue estudando para prestar novos exames, na tentativa de fazer a residência que lhes faltou na formação, ao mesmo tempo em que dará plantões em hospitais do SUS ou de convênios para não depender da mesada dos pais aos 25 anos.

Fonte: https://drauziovarella.uol.com.br

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